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Chuva no ser.

 

A chuva persiste, resiste, insiste em cair,
Chove em nós, passam anos, e é chuva a subir,
Água destilada, virada para baixo, a água,
Do lado inverso a evaporação não se nota,
Não suscita histórias, como pingas grossas,
Não alaga cidades e margens nem rebenta barragens.

 

A precipitação do dia seguinte cai em cima de hoje,
Cai a culpa num mar revolto dentro de cada ser,
Alongado, circular, cubóide, andróide tem de ser.

Todos sempre à incómoda chuva, despropositada.

 

Condensadas águas em ordem ao mar,

Chuvas de março, tempo para se aconchegar,

Manhãs sombrias no tempo da poesia
que tarda em se manifestar,

profundamente coerente como deve ser.

 

Eis que uma tarde brilha a rainha da luz
Acha-se o verão para os que lá estão,
Sol de graça no rosto, sol de adeus,
Até mais ò chuva que és toda defeitos
Na hora em que não te louvam os feitos.

 

E o sol torra a semente de gente que somos,
Afogada pela chuva, dissipada pela ventania,

há quanto tempo a não via,

E então é só defeitos,

é dessa matéria que nós somos feitos,

uma garrafa, um dia,

meia cheia ou meia vazia.