carminha nieves

OS SONHOS FICAM PARA DEPOIS

                                   OS SONHOS FICAM PARA DEPOIS.

 

Muito jovem e inocente, queria tocar piano, compor melodias eternas. Queria ser bailarina voar leve em pontas, com os meus gatos e cães como expectadores. Nunca pensei em casar, adorava estar à janela da galeria, ver as estrelas e elevar-me a sítios que não existem, queria ser a alegria dos outros, sei lá. Pobre criança que aos lobos foi deitada, tão indefesa. Com maldade, ou premeditado nunca fiz nada de mal. Mas na santa inocência e ignorância algumas coisas fiz. Sem arrependimentos hoje choro a juventude perdida, sonhos, desejos. Era tão pouco! Só queria tirar das notas do meu piano canções por inventar e dançar envolta em sedas e como pluma de uma ave qualquer abraçar as nuvens e o céu. Toda a vida esperei que algum desejo fosse realizado. Mas em vão, aqui cheguei sem nada mãos vazias, só a recordação de criança tenho no meu querer. Adoro música, suave que como cordas de uma harpa, arrepiam e transformam a lagrima em desejo de conseguir chegar a algum sonho que viva dentro de mim.

Ninguém me vê, só. Falo com Deus e não tenho resposta. Cara molhada, respiração ofegante, por vezes um grito camuflado, suspiros profundos, de uma tristeza sem tamanho, toda a manhã ou tarde sou a enjeitada, a pobre, a infeliz, que por algo especial meto inveja, quando de mascara saio e estou entre a gente. Pergunto que e de quem estou a pagar pecados? Não entendo. Estou cansada, magoada, infeliz, porque o que me deu alegrias e um pouco de felicidade nunca mais voltará a dar.

Coração aberto absorve toda a magia dos sons da musica, sinto-o abraçá-la, sei porquê, é o passado cheio de sonhos dentro de mim, que bailam, correm, choram e amam a simplicidade do meu ser.

Quando morrer quero a minha música a tocar baixinho. Só eu e ela. Família nunca. Se abandonada estou em vida, não quero ninguém junto ao meu corpo inerte. No notário já estão as minhas últimas vontades. Assim será. Só as mãos que me amparam hoje podem lá estar. As estendidas á espera do que em hipótese posso deixar, não.

Tenho tantas saudades hoje! Incómoda, só quero deixar deslizar as lagrimas pelas rugas que as tenho com orgulho e carinho e ter alguém que as aceita.

Hoje nem um telefonema, nem um faz de conta que sou Mãe, me demovem do caminho que escolhi no meio dos destroços em que deixaram a minha vida.

Para as Mães felizes um abraço, que sempre sintam o amor dos filhos, incondicional e puro.

Porto, 3 de Maio de 2015

Carminha Nieves