A mãe é o fogo da comunhão da casa[i]
A mãe, ungida, substancialmente pura,
elixir necessário à invenção da noite clara, ergue-se
devagar como um farol a indicar o caminho ao filho
― como se fosse ao navegante perdido ―
que trilha as tortuosas asperezas da vida.
Desde o princípio ao fim é o fio exímio que traz a leitura
da casa em pé. Do excesso das suas entranhas, sai
\"segundo as redacções de Deus (o mais) extremo exercício de beleza\".
O seu corpo ergue-se enxuto, mesmo quando as rugas
potenciam a duração do tempo.
Elas são a fonte essencial da vida a reforçar a dádiva
que recebeu de Deus para manter o fogo aceso:
― o fogo da comunhão da casa.
Se alguém te perguntar porque resistes ao tempo
e a todas as maldições que o tempo impõe
― e que muitos atribuem ao sono eterno de Deus ―
dirás, apertando a tua mão na minha mão, e unindo
a tua saliva à minha, que a culpa é da comunhão
solene da nossas línguas unidas numa só língua.
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in \"A Alquimia do Verbo em dois ciclos para um poema\" de Alvaro Giesta
intertexto com Herberto Helder
[i] [i] [com passagens de Herberto Helder em A Faca não Corta o Fogo]