alvarogiesta

Pelas paredes deste santuário

Às vezes abandono o corpo no silêncio frio

das pedras deste santuário

onde corpos anónimos se prostram para o juramento.

Erguem-se muros de silêncio à minha frente.

Incógnitas promessas e soturnos cânticos celestiais

ecoam na solidão da majestosa nave,

sacrificada pelo mau instinto do fogo e dos homens.

Memórias de santos e exéquias reais

escrevem-se, quase anónimas, no silêncio dos túmulos.

Presa pela garganta a degolar, sinto a má memória

ao recordar a matança da páscoa, hedionda e vil.

 

Pelas paredes deste santuário, como as osgas solitárias,

a minha sombra rasteja em meditação muda e surda.

Sobressalta-me o rumor de tantas falsas ladainhas,

quase inaudíveis. Este estranho som mancha o silêncio.

 

As minhas mãos tacteiam, nesta semiobscuridade,

o percurso do sangue e da memória.

Tolhe-se-me o gesto de persignar-me, quando ajoelho,

com receio de acordar este silêncio.

 

[1] [igreja de S. Domingos, Stª Justa, Lisboa, onde começou o “Massacre de Lisboa” de 1506, também conhecido por “Matança da Páscoa” (perseguição e matança pela população, de mais de 4.000 judeus acusados de serem a causa de uma seca, fome e peste que assolavam o país), sacrificada pelos terramotos de 1531 e de 1755 e pelo incêndio de 1959, onde muitas vezes (entre 1978 e 1998) ia “apenas” meditar]