Cornucópia

Está a correr o projeto,

Denota sem juízo feito,

A duvida sobre o proveito,

A certeza de que não é correto

E, literalmente, sem notas.

Sem notas para poupar.

Com notas para contar

E moedas para nos lavar.

Deixei de ouvir.

Ruído de barragem, intenso,

Ruir do meu tímpano

Que lembra a queda

Do chá nas águas do cais.

Cumprimento-me atenciosamente.

De mim para o Excecional.

Ruelas por onde me palpito,

Lamacentas, ladeadas de esparsos lampiões

Donde a luz amarela, sombreada por insetos,

Imundos, trás um sabor a excremento vencido.

Hoje sou a caca do cão do vizinho,

Diria uma senhora com ironia nos dentes bem cuidados,

Perdida nas memórias desarrumadas deste escrivão vencido,

Sem desejo de calor ou de frieza,

Indiferente ao decorrer dos preciosos momentos

Aonde se desdobra a água que sulca,

Em corrente, irresistível caudal,

O tempo que não dá abrigo.

Tempo de jazigo,

Entremeado de avó,

Antecipado de década paterna.

Tempo deitado

Que não descansarei,

Reduzido à máscara

Que me enganei e não tirei

Em vida rasgada,

Refeita, redesenhada.

Máscara da mentira impiedosa

Que me cala e me sufoca

E me grita para fingir.

Fingir, mentir, fugir.

Encobri e calei sem o querer.

E hoje não há sirene que não clame por mim,

Quando viro costas e esquinas,

Quando paro e ando, angularmente

Onde me penduro.

Acorrem os dedos

Donde os folículos escorregam

Como se escapa a perna,

Quebrada no descuido,

Enrolada e partida.

Se escaparei não o creio.

E se escapasse, de que escaparia?

Se me rio nos risos que desempenho...

Certamente sim, que o riso é a melhor resposta

Quando penso, reflito ou pondero em mim.

Sou o limiar da realidade sem fronteira,

A ilha de Seabrook

A ilusão de Abraão

As mãos de Pôncio Pilates

A barba de Noé na cabeça de Sansão,

E a unha partida no pé, fundamental

Que define pela parte o todo por que te bates.