Ouço tuas canções
e penso um nome:
Santiago de Compostela.
Eras, de fato, um homem
incognoscível. Infatigável
companheiro do vento
gostavas do cheiro do mar
eras amante dos Beatles, do Blues,
da América Latina, e às vezes
te deleitavas com a musicalidade álacre
dos pardais que debruçavam nos desvãos
das manhãs em tuas janelas
alumbradas.
Conhecias os sortilégios do amor
e a dor guardada
dos suicidas. Com Dante
discutias a nulidade da coisas, os arcanos
da metafísica, os imperativos
da ética e a bifurcação dos caminhos. Sabias
do secreto caminho e da escadaria
das beatitudes e danações
anunciadas nos pergaminhos. Com Heidegger
confrontavas a casuística do amor
e em manhãs de frio e de vento
te afligias com a percepção nostálgica
de teu próprio existencialismo reticente.
Menestrel, poeta
oráculo, sonhador
ou homem triste? O que sei
é que cantavas a melancolia
das ruas, teu tédio, o açoite
do medo, as dores sem remédio
dos desamados, a ternura
dos subúrbios e a intensidade
dos homens algemados
à sua pressa
e a seus jornais.
Mas te viste, de repente
o coração fatigado
abscôndito ante a clepsidra
os olhos em arremesso
para o infinito.
E era tudo tão vasto: As vozes
da avenida, as cores da alba
os sons da noite
em esvaimento...
Era sessenta
- exatamente sessenta -
a soma de teus anos.
E ainda nem sabias
da musicalidade oculta
na pulsação secreta das estrelas, da soma
das constelações, da heurística
de Nielsen (este aríete indômito
demolindo muros de separações).
E de onde nascia
esta névoa, com sua fúria
sobre teus cabelos e assomava
imperceptível como uma sombra
sobre o fogo de tua íris? E para
onde fugirias com tua consciência
no instante em que teu corpo
alquebrado sob o fardo dos outonos
com toda a soma de teus gestos
memórias, devaneios mergulhasse
nos ocultos labirintos do sono?
De repente
já era sessenta
- exatamente sessenta -
a soma de teus anos!
(E vias, maior ainda
a soma dos enganos).
Então se deu o acontecido.
Abria o dia
com suas asas acesas, quando
despojado de tua música
de tua fúria
e de teu blusão de couro
desceste a escadaria. Tinhas
a fleuma icônica
de um cenobita.
E do arabesco das sombras
te lançasteo
contra o acre dos gases
argonauta súbito
com teu bigode impávido
guiando as frotas
do descobrimento.
E desde então
já não envias tuas cartas
já não leio teus poemas
Mas dizem que, em desapego
te deleitas ante a placidez de um mar
nalgum secreto recôndito
de um secreto país lunar.
E era sessenta
- exatamente sessenta -
a soma indefectível
de teus anos.
[Taiobeiras, MG- 02/02/15]
- Autor: Claudio Sampaio (Seudónimo) ( Offline)
- Publicado: 15 de marzo de 2017 a las 00:26
- Comentario del autor sobre el poema: Homenagem ao cantor Belchior, desaparecido
- Categoría: Reflexión
- Lecturas: 24
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